Não vi ameaça mais concreta à democracia do que a “lava jato”, diz Gilmar Mendes

“Não vi ameaças mais concretas à democracia no país senão a partir de iniciativas de grupamentos corporativos de procurador, juiz, órgãos da Receita e Polícia Federal. Esse conúbio colocou em risco aquilo que entendemos como Estado de Direito e devido processo legal”, afirmou o ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal

Com ConJur

Foi no lançamento da 15 edição do Anuário da Justiça que aconteceu nesta terça-feira na internet com participação do presidente do STF, Luiz Fux; da presidente do Conselho de Curadores da Faap, Celita Procópio; do STJ, Humberto Martins entre outras personalidades do meio jurídico.

o ministro voltou a fazer críticas à “lava jato” e às “dez medidas contra a corrupção”, proposta legislativa de iniciativa de membros do Ministério Público que tramitou no Congresso Nacional. Gilmar Mendes, com uma visão privilegiada da democracia brasileira, depois de ter passado pela Casa Civil e pela Advocacia-Geral da União antes de chegar ao STF, lembrou de propostas “fortemente autoritárias” apresentadas pelos procuradores ao Parlamento: permissão para o uso de provas ilícitas e restrição brutal à concessão de Habeas Corpus.

“Só na ditadura o HC sofreu limitação, ainda assim no AI-5. As dez medidas desenhavam um modelo autoritário, estávamos muito próximos de ser submetidos à ditadura de Curitiba”, disse. É preciso estarmos atentos aos salvadores da pátria — venham eles do Legislativo, Executivo ou Judiciário — recomendou o ministro, e acrescentou que esse é o legado que fica da fase crítica da “lava jato”.

Gilmar Mendes também falou sobre o uso das delações premiadas pelos procuradores de Curitiba. “A nossa luta contra a ditadura foi pelo devido processo legal, pelo Estado de Direito, pelo fim da tortura. Com as delações premiadas, você introduz um elemento de tortura para obter a delação”, disse. “Descemos muito na escala das degradações.”

A democracia enfrenta muitos desafios atualmente, não apenas a brasileira, afirma o ministros ao lembrar da invasão ao Capitólio, nos Estados Unidos, fato que considerou “chocante”. Para o ministro, fatos como esse, mostram como grupos, “pretensamente democráticos”. O caso aconteceu em janeiro de 2020.

O ministro falou sobre as dificuldades do modelo de representatividade, das suas insuficiências e do fato de não conseguir alimentar o sonho de todos. Ressaltou que a democracia é um regime complexo e que se pauta por regras escritas e outras não escritas. “Há uma série de regras não escritas, que devemos respeitar. Não podemos atacar as pessoas, temos de ter uma atitude de tolerância, não podemos eliminar o adversário, o adversário não é inimigo. Precisamos trazer a democracia para civilizar a internet”, disse.

O advogado e ex-presidente da OAB, Marcus Vinicius Furtado Coêlho, que também participou do evento, destacou a influência da rede mundial de computadores e das redes sociais na democracia. Citando o livro Os Engenheiros do Caos, ele afirma que o discurso de negacionismo, de aversão à cultura e totalitarismo não é aleatório e se repete em vários lugares do mundo “para atrair acessos na internet e vincular as pessoas a determinados pensamentos”.

Segundo ele, os partidos políticos também têm uma participação importante para a construção da democracia. “Os partidos precisam ter responsabilidades de lançar nomes que sejam comprometidos com a democracia. O livro cita diversos momentos da história do mundo que eventuais pessoas de direita chegaram a votar em candidatos de esquerda para impedir que alguém da extrema direita fosse eleito, para defender a democracia.

Para Marcus Vinicius, é fundamental que o primeiro compromisso seja com a democracia e com o estado de direito. “Dentro do sistema de Justiça, o discurso autoritário vem na pregação do discurso de ódio contra parte adversa. Na democracia não devemos pregar ‘o aniquilar do adversário’, ou seja, o adversário necessita existir. Temos que ter amor ao debate. As ideias devem brigar, as pessoas jamais”, ressaltou.

Com informações do ConJur

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